Lar das Orquídeas


Dona Tereza estava fazendo seu crochê, sentada numa cadeira de balanço na pequena varanda de sua casa, quando viu um carro luxuoso estacionar. Um homem muito elegante desceu do carro e seguiu em sua direção. Ela fixou seus olhos nele e deixou sua agulha cair. Com muita dificuldade se levantou. Os olhos marejaram rapidamente.
__ Abel!
__ Mamãe!
Ela o apertou contra o peito e depois segurou em suas mãos e ficou a observá-las. Beijou-as e em seguida acariciou seu rosto.
__ Meu caçula, meu menino...
Abel não visitava sua mãe fazia dez anos e meio. Depois que se mudou para a capital nunca mais voltara à pacata Vale do Ipê, uma cidadezinha encravada no interior de Minas Gerais.
__ Eu vim buscar a senhora, mamãe. Não quero deixá-la sozinha nesta cidade. Arrume as malas e amanhã bem cedo partiremos.
Aquela noite dona Tereza nem dormiu direito. Ficou imaginando sua vida na casa de seu filho, com os netos, a nora... Sentia-se amparada por ele. Pelo menos um dentre os seis filhos era grato por tudo que ela havia feito por eles. Assim que Abel dormiu, ela foi correndo contar a novidade para uma vizinha. Estava eufórica, não pelo fato de sair de sua casa, mas por ter sido lembrada pelo filho, por se sentir amparada e amada. Nem sabia se conseguiria viver na capital, mas iria para agradar ao seu caçulinha.
No outro dia despediu-se dos vizinhos que ficaram em lágrimas, pois ela era a alegria daquela rua. Morava no mesmo lugar há mais de sessenta anos. Todos a conheciam e admiravam sua jovialidade apesar dos quase noventa anos.
Quando chegaram à capital, ela receosa, indagou:
__ Meu filho, conversamos sobre vários assuntos, mas tem uma coisa que eu quero lhe dizer e espero que não se ofenda.
__ Diga mamãe.
__ É que você está me trazendo pra sua casa, mas eu não sei se vou me habituar. Você sabe, eu gosto do meu cantinho. Vou passar uns tempos e depois volto.
Abel sorriu.
__ Mamãe, mamãe! Na minha casa a senhora não iria se sentir bem, meus filhos são muito bagunceiros, minha esposa trabalha muito e eu também não terei muito tempo. Além do mais a rua onde moro é muito barulhenta. A senhora merece um lugar sossegado, tranquilo, com muita gente pra conversar...
Dona Tereza segurou forte uma sacola que trazia nas mãos, olhou pelas ruas e viu alguns mendigos nas calçadas. Uma pontada no peito lhe incomodou naquele instante, mas se manteve firme. De repente seus olhos contemplaram um casarão do século passado, mas muito bem conservado, onde trazia na sua fachada uma placa em letras douradas: “Lar das Orquídeas” E eu lá sou uma orquídea? – pensou.
Abel todo empolgado abriu o porta-malas do carro e um rapaz de uniforme pegou a bagagem e desapareceu pelo casarão, enquanto uma senhora muito simpática deu as boas vindas à dona Tereza e a conduziu até seus aposentos.  Alguns idosos passeavam pelo lindo jardim, repleto de orquídeas. Algumas rosas e violetas dividiam o espaço em alguns canteiros.
__ E aí mamãe, gostou? – Indagou Abel, mostrando o quarto luxuoso, equipado com TV de plasma, frigobar, uma cama de casal muito aconchegante, ar condicionado, tapetes persas... Tudo que ela não tinha na sua humilde casa.
Ela sentou-se na cama, olhou para os lados, depois suspirou fundo, levantou-se e o abraçou forte.
__ Obrigada. Você fez a sua parte, conforme seu coração pediu. Não se esqueça meu filho, que eu te amo muito. Agora pode ir para junto dos seus filhos, eles devem estar esperando por você, não os decepcione...
Abel estava se sentindo realizado. Tinha certeza que tinha feito o melhor. Nem notou a voz engasgada de sua mãe ao se despedir.
Ela o olhou até sumir no corredor, depois trancou a porta, deitou-se na cama e derramou todas as lágrimas que havia segurado até aquele momento. Não queria decepcionar o filho. Não queria que ele soubesse o quanto ela detestou aquele lugar, o quanto se sentiu decepcionada. Os soluços começaram fortes e depois foram diminuindo. Estendeu a mão e pegou um telefone que estava ao lado da cama. Ligou para sua vizinha e pediu que fosse buscá-la no dia seguinte. Devolveu o fone à base e se entregou nas mãos dos anjos.
Vale do Ipê decretou luto por três dias. A cidade inteira se comoveu e várias homenagens foram feitas àquela simpática e bondosa velhinha que a tantos alegrou. Partiu deixando saudades e um legado de muito amor e dedicação.

Juarez do Brasil

Um comentário:

Sirlene Rosa disse...

Comovente e muito real essa história...
A contar pelos 10 anos que não via a mãe, já imaginava um final como este...
Incrível como muitos filhos tratam seus pais como móveis velhos que não servem para nada, apenas para estorvarem suas vidas!
Parabéns pela abordagem, Juarez!!
Como sempre irretocável!!
Grande abraço e sucesso sempre pra você!