(Minha avó me
contava várias histórias, esta é uma delas. E contava à noite, antes de
dormir).
Numa
sexta-feira, quando dava a última comida para os porcos, Gusmão ao retornar
para casa esbarrou-se numa galinha que estava amuada perto de uma bananeira.
Ela apenas deu um pio e continuou no mesmo lugar. Ele abaixou lentamente e a
tomou em suas mãos. Percebeu que não era do seu terreiro. Talvez fosse de algum
vizinho. “Pobrezinha, está perdida,” pensou. Ele a levou para dentro de casa.
Carmelita o repreendeu na hora em que o viu com aquela ave debaixo do braço.
Pediu que a levasse para o quintal. Ele ficou assustado com o tom da sua voz e
disse que iria colocá-la no galinheiro. Carmelita deu as costas e foi arrumar
as camas das crianças, pois deitavam muito cedo. Depois de se deitarem, ela ouviu
um barulho dentro de casa e se levantou rapidamente. Foi até a cozinha e não viu
nada. Depois se dirigiu até o quarto das crianças e acendeu a luz. A galinha
estava na cabeceira da cama de Mariana, a filha mais nova. Imediatamente ela a
tocou para fora de casa.
Voltou para
seu quarto e acusou o marido de ter colocado a ave dentro de casa.
__ Lugar de
galinha é no terreiro! Você tem cada idéia!
__ Eu não a
coloquei aqui dentro, você tá doida?
__ Então essa
galinha tem poderes mágicos, entrou aqui através das paredes, igual fantasma –
ironizou.
No outro dia
logo cedo, Gusmão se levantou, mas Carmelita permaneceu na cama. Ele achou
estranho, mas foi tratar das criações sozinho, e quando voltou sua esposa ainda
estava deitada. Acordou as crianças e preparou o café pra elas. Foi até Carmelita
e a repreendeu por não ter acordado na hora de costume. Ela disse que estava
cansada.
__ Carmelita, essa
galinha não é de ninguém aqui da redondeza. Eu sondei na vizinhança. Vamos cuidar
dela até que apareça o dono. Com certeza alguém virá procurá-la, pois é de uma
raça diferente das que estamos acostumados a ver.
Mais tarde
Carmelita foi até a horta e escutou sua filha menor conversando e dando
risadas. Aproximou-se de uma amoreira enorme no quintal e a viu sentada num
galho ao lado da galinha, que ao vê-la alça vôo e pousa bem longe delas.
Carmelita nunca vira uma galinha voar daquele jeito, ficou encabulada. Levou
sua filha pra dentro e contou o episódio ao marido.
Outras vezes
flagrou sua filha na amoreira, na mesma situação, mas ela sempre dizia que
estava cantando. Cada vez ficava mais intrigada, mas seu marido dizia que
criança era assim mesmo.
__ Acho que
você ainda não percebeu o que está acontecendo com a gente.
__ Percebi
sim. Você está ranzinza e insuportável. Não compreende as coisas mais simples.
É só uma galinha.
Carmelita saiu
para o quarto, pegou a Bíblia e começou a ler. Ouviu sua filha conversando, foi
até ela. A galinha estava lá na cabeceira da cama. Irritada tentou segurá-la
pelo pescoço, mas desta vez ela ficou brava, e começou a beliscar sua mão, os
olhos pareciam avermelhados. Gusmão chegou assustado, aproximou-se da galinha e
a pegou tranquilamente.
__ Nem a
galinha está te suportando. Pobrezinha, você a assustou.
Carmelita
percebeu que havia algo errado naquela ave, mas nada comentou, pois sabia que
não iriam acreditar.
__ Gusmão eu
tomei uma decisão. Vou matar a galinha, o dono não apareceu mesmo. Estou com vontade
de comer sopa.
À noite Carmelita
a prendeu no galinheiro. No outro dia quando foi matá-la, não a encontrou. Olhou
desconfiada para o marido e o acusou de tê-la soltado. Ele simplesmente
balançou a cabeça em sentido negativo.
Procuraram por
todo o quintal, mas não a encontraram. Mais tarde ela apareceu na porta da
cozinha. Estava piando choco.
Passaram dias
tentando descobrir o ninho dela, mas não conseguiram.
Dois dias
depois Carmelita viu sua filha menor se embrenhando no mato. Chamou seu marido
e a seguiram. Passaram em meio a tantos espinhos e acabaram entrando numa gruta
gelada. Ouviram a filha conversando. Acenderam a lanterna. Lá estava a galinha
em meio a inúmeras cobras que se enroscavam em seu corpo, mas não a picava.
Mariana estava sentada no chão de longe observando.
__ Meu Deus! –
exclamou Gusmão.
__ Mariana! –
gritou a mãe.
A criança
assustou-se e correu para o meio das cobras. A galinha voou até eles e
começou a bicá-los violentamente.
Os dois não se
intimidaram ao perceber do que se tratava e clamaram a presença de Deus. Não
tremeram, oraram e quanto mais eram bicados mais pediam a presença do Todo
Poderoso.
__ Minha
filha, o papai te ama e vai tirar você daí.
Nisto a galinha
abriu as asas e uma a uma as serpentes foram se abrigando debaixo dela,
desaparecendo em seguida. A
galinha se arrepiou toda, suas penas foram se soltando rapidamente formando um redemoinho
e levou tudo pelos ares. Ouviu-se um gemido ensurdecedor e apavorante.
Mariana voltou
correndo para os seus pais e os abraçou. Nada restou naquele lugar. Voltaram
para casa certos de que amor destruiu todo o mal.
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