Vale da Libélula

 


Queria falar de algo engraçado, mas não vejo graça em nada depois que ele se foi. Queria falar de esperança, mas nada espero mais. Durmo e levanto sem expectativas; tenho vivido o verdadeiro “tanto faz”. Tanto faz se está frio ou calor, tanto faz se estou viva ou não, nada mais importa. Nada me atrai, nada me estimula, nada me alegra. Não sei descrever meus sentimentos, não tem como mensurar minha dor. Vivo como se nada mais valesse a pena, e sei que as pessoas se incomodam com isso, mas nem isso me importa, eu é que sei o que estou passando. Sou eu quem acorda todas as noites revirando na cama procurando por ele, sou eu quem sente a falta dos seus abraços, dos seus carinhos, sou eu quem ficou sozinha; e na escuridão da noite não tem mais com quem dividir os lençóis, nem com quem tomar o café da manhã.


Até quando viverei assim? Cada um me fala uma coisa. Dizem que com o tempo a gente acostuma com a saudade, dizem que pouco a pouco aprendemos a conviver com a ausência, mas até hoje não aprendi, até hoje tenho tentado. Sinceramente tenho tentado, mas fracassei em todas as tentativas. Éramos cúmplices um do outro, amantes apaixonados e o destino nos separou, deixando-me assim sem apoio, sem amparo; totalmente desprotegida.


Eu li alguns livros sobre o assunto, e quase todos dizem que a vida continua, que precisamos enfrentar a dor e o sofrimento, mas na prática não é tão simples. Eu sei que não há uma receita universal para superar a perda, mas tenho tentado sobreviver. Só não quero mais fingir que estou feliz quando há em meu peito um vazio, uma névoa que envolve meu coração e me deixa desnorteada. Parece que nunca vai passar. Às vezes penso que sou fraca demais, vejo algumas pessoas que passaram pela mesma situação e se refizeram rapidamente, estão felizes; algumas até encontraram novo amor, mas não consigo me imaginar com outro homem, tenho a sensação de que estrarei traindo o grande amor da minha vida, ainda não estou preparada para um novo relacionamento e nem sei por que estou dizendo isso aqui, mas é que muitos me dizem que devo enterrar o passado e viver o hoje.


Já faz um ano e meio que Samuel foi tirado de mim, mas parece que foi ontem, e cada dia que passa tudo dele vai deixando de existir. Nem mesmo o seu cheiro existe nas roupas que guardei; se eu tivesse um filho. Ah! Se eu não tivesse sido tão egoísta teria dado a ele o filho que ele tanto queria, mas pensei em meu corpo de modelo, não queria interromper a profissão, não queria ganhar uns quilos a mais, pedi um tempo sem saber que ele já não teria mais tempo pra viver comigo. Ah! Se eu soubesse o que estava para acontecer! Com certeza estaria com um filho nos braços. Um descendente dele. Mas não dei a ele esse privilégio de ser pai. Talvez seja por isso que sofro tanto. Dor e culpa torturam minha alma, e eu tenho medo que eu não consiga me perdoar por isso um dia.


Apesar de toda a dor e sofrimento que tenho vivido neste tempo, apesar de viver o tanto faz nunca me passou pela cabeça a ideia de suicídio e até me surpreendo por isso, pois do jeito que vivo é como se já não existisse, talvez até por isso não tenho esse desejo. Eu sei que um dia vou superar. Sei que um dia vou poder dizer que a saudade existe, mas a dor foi embora, e como anseio que chegue este dia, e como desejo poder dormir e acordar com a alma em paz e dar um bom dia vindo do fundo do coração, trazendo aquela alegria que eu tinha antes. Na verdade se penso assim é porque tenho esperança. Nem que seja um fio de esperança. E além da saudade que sinto de Samuel, tenho saudade de mim.


Tenho saudade das minhas risadas, das minhas piadas, do meu bom humor, do meu alto astral. Tudo se foi. Tudo se perdeu. Nada mais tem sentido, nada mais importa, até sorrio, mas o coração permanece coberto pela névoa e parece que nada vai curar essa tristeza que há dentro de mim. Por isso, finalizando esta carta, meu Deus, peço perdão se não tenho enfrentado com sabedoria os seus desígnios em minha vida, e não sei se mereço, mas me atrevo e peço que tenha misericórdia desta sua filha que sofre.


Vale da Libélula, 30 de julho de 2013.


Teresa Carmelita de Jesus. 


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